Nem sempre são estrelas no céu

      Pelas luzes que entram nas frestas da parede, acordei nesta cela há três dias – se este é o tempo que estou aqui, já são outros quinhentos.  Quando acordei aqui pela primeira vez, estava com uma dor de cabeça do caralho e essa maldita dor reaparece sempre que acordo. Dá vontade de não dormir, mas não adianta tentar, o cansaço sempre me vence. Tenho sonhos maravilhosos de dias comuns, em casa, fazendo alguma coisa qualquer.
      À minha volta não há muita coisa. O pé direito desta cela é muito alto. Há frestas por onde entram luz e ar, mas não posso alcançá-las nem ver o céu. Há também uma porta com uma portinhola e colocam comida vez ou outra, mas não sou capaz de ver algo além dela. Dos móveis, há esta cama (da qual mal saio), um sanitário, uma mesa, uma cadeira e uma pia. Minhas roupas são normais, mas não consigo reconhecê-las como minhas. Tudo está sempre limpo, mas não me lembro de ter visto ninguém por aqui. Já tentei gritar, bater na porta, chorar, o escambau, e nada. NADA. Me senti triste, desolado, desesperado e de diversas outras formas, mas agora só me sinto confuso e quero sair dessa merda, lembrar de algo, sei lá!
     É possível escutar um barulho diferente, mas não consigo identificar se vem das frestas ou da porta. Chuva? Ar-condicionado? Algo sendo arrastado no chão? Que loucura! Meu deus, não consigo reconhecer um barulho! Merda! Estou cansado. O barulho é intenso, me incomoda, sinto uma sensação ruim, como se eu tivesse sido arrastado dentro de um saco.
       Ei! Perainda! Fui arrastado em um saco? Caralho, fui arrastado em um saco!
      Quem me arrastou? Por que diabos eu fui arrastado? Mas será o benedito?! Não tem NINGUÉM aqui! Nem para dividir essa bosta de cela!
       Caralho, que sono! Por que meu corpo não entende que não quero mais dormir nesse lugar? Que não aguento mais sentir dor quando acordo? Que mer...

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      Onde estou? Minha visão está embaçada. Não sou capaz de identificar algo mais que vultos e sussurros ininteligíveis. Minha cabeça dói. Quero perguntar que merda é essa aqui, onde estou, quem eu sou...

        Argh! Não consigo falar nem mexer meu corpo, só os olhos! E consigo para quê? Para ver tudo embaçado, parecendo que fui a uma droga de oftalmologista! Pior, na verdade... Sou obrigado a ficar aqui, conversando comigo mesmo! Vou acabar enlouquecendo desse jeito. EU QUERO SAIR DAQUI! ALGUÉM ME ESCUTA, POR FAVOR!
       Lágrimas descem pelo meu rosto. Calma, respira... O que me lembro? Vai, Éric! Você conse... Opa! Meu nome. Muito bem, o que mais? Eu lembro que... Droga! Não lembro! ALGUÉM ME AJUDA! VAI, GRITA, CORPO DE MERDA!
          Minhas lágrimas tornam minha visão embaçada muito pior. Nada é visível agora...

        Pera, calma! Lembrei! Eu estava sentado, na praça em frente à minha casa. Tinha ido fumar e estava em uma... Pera, eles estão me percebendo! Os sussurros se tornaram mais altos, mas ainda não consigo distinguir. Eles estão chegando perto! ME ESCUTEM! POR FAVOR! ME TIREM DAQUI!

         MERDA! Estou com muito sono, não consigo lembrar mais nada... Não durma, corpo! Eu tenho que aguentar um pouco m...

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      O que houve? Que dor de cabeça! Parece que tive um sonho louco por alguns segundos... Mas não, aqui estou, sentado. Meu cigarro está na mão, pela metade. O céu está bonito esta noite. Há uma luz estranha... Um objeto voador, mas não consigo identificar, está muito distante. Voa de uma forma estranha e some.
      Tenho que contar para Vitor! Procuro meu celular no bolso e abro o aplicativo de mensagens. Meu deus! Tem muitas mesagens! Mas como, se eu acessei agora há pouco? As primeiras conversas são todas de grupos, procuro por Vitor, depois olho as outras. Abro as conversas. Várias mensagens do tipo: "Cadê você?!"; todas preocupadas e algumas raivosas pela minha não resposta. Estou confuso. O que é isso?

      Subo mais a conversa, vejo as mensagens da última conversa:


[21/3 20:05] Éric: Man, cê tá olhando o céu?
[21/3 20:07] Vitor: Não, qual foi?
[21/3 20:07] Éric: Estou vendo agora mesmo um ovni, distante.
[21/3 20:08] Vitor: Hum... Já pensou que você pode estar vendo, mas é você quem deve estar sendo observado?


Autora: Stephanie Santana
Twitter e Instagram: @sobreumabismo
Imagem encontrada no WeHeartIt (https://weheartit.com/entry/318863951/via/nadamaiis)

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